terça-feira, 29 de maio de 2012

BELO MONTE: Numeros Omitem Problemas Diários

"Fiquei igual a cachorro na rua", disse trabalhador da usina hidrelétrica



Altamira (PA). Números são repetidos à exaustão para ressaltar a grandiosidade da usina hidrelétrica de Belo Monte, obra do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) que começou a ser construída em junho do ano passado no rio Xingu, na região da cidade de Altamira, no Pará, e será a terceira maior do mundo.

Números dão conta de mensurar o dinheiro necessário para o empreendimento - R$ 25,8 bilhões -, aquilo que a engenharia é capaz de fazer - como abrir 260 km de estradas em plena floresta amazônica - e o que as turbinas irão produzir - 11,2 mil MW -, mas não conseguem dimensionar sentimento humano. "Eles (empresa) contratam e demitem como se a gente fosse objeto", resumiu um operário.

"Fiquei três semanas igual a cachorro na rua", disse Moisés de Oliveira, 32, que, mesmo aprovado no exame médico, teve que implorar ao Consórcio Construtor de Belo Monte (CCBM) por teto e alimentação.

"Ouvi falar que aqui estava bom, mas cheguei e encontrei essa bagunça", disse o ajudante de corpo franzino, que nasceu em Angra dos Reis (RJ) e tentou emprego na usina de Jirau, em Rondônia, antes de rumar para Altamira, em março.

Colocado em um dos alojamentos - as chamadas "carpas", tendas montadas nos canteiros de obras, em clareiras na floresta amazônica -, Moisés de Oliveira ficou doente por causa da baixa temperatura do ar-condicionado. "Eles baixam o ar para 16º e dão só um lençol para servir de cobertor". Com pneumonia, ele conseguiu ser transferido para um hotel na cidade.

Quando falta luz ou os geradores são desligados para manutenção, contou o encanador maranhense Ernaldo Almeida, 34, "deve dar uns 40º de temperatura" nos abrigos. O barulho é outro inimigo do descanso. "De um lado é oficina, do outro um gerador, uma área de lazer. Duvido que alguém durma naquele inferno", descreveu. Os alojamentos definitivos, feitos de PVC, estão em construção.
ISOLADOS
Distância da família causa sofrimento
Altamira, a principal cidade no entorno das obras de Belo Monte, é uma típica cidade do Norte do Brasil, com todo o atraso e falta de estrutura que essa condição impõe. Metade dos trabalhadores da usina é do município, que fica incrustado entre o rio Xingu e a rodovia Transamazônica.

Naldo Ferreira Gomes, 35, faz parte da fatia dos 35% de operários que são de outros Estados. No fim do mês passado, o motorista, que deixou a família em Santa Inês, no Maranhão, estava esperançoso de que conseguiria viajar para casa, após seis meses no Pará.

"Fico muito tempo sem ver minha esposa. Minha filha sente saudade, chora, querendo o pai", disse Gomes. Embora seja garantido em contrato, o direito à baixada nem sempre é respeitado, denunciam alguns trabalhadores. (JT)


Fonte: Jornal O Tempo