sexta-feira, 15 de abril de 2016

Já fragilizada, Funai sofre cortes de orçamento e de pessoal

A Fundação nacional do índio em Mato Grosso do Sul deve passar por desmonte institucional com cortes feitos no orçamento e nos cargos

Já fragilizada, Funai sofre cortes de orçamento e de pessoalSede da Funai em Campo Grande (foto: Geovanni Gomes)
A Funai (Fundação nacional do índio) inicia 2016 com o menor orçamento em 4 anos. De acordo com a assessoria da entidade em Brasília, este ano o orçamento é de R$ 502 milhões, menor valor desde 2012. Em 2015, por exemplo, o orçamento foi de R$ 639 milhões.

Esse valor é responsável por despesas com pessoal (salários e benefícios), cumprimento de sentenças judiciais e despesas discricionárias (despesas utilizadas diretamente para atendimento aos indígenas e pagamento da infraestrutura como aluguel, energia e telefone etc). Em relação a essas despesas, a queda no orçamento, comparado com o ano de 2015, foi de 37%, e deve afetar as coordenações regionais (CRs).

Outro corte que deve fragilizar a Funai em Mato Grosso do Sul é a redução no quadro de funcionários. A Funai em todo o país tem hoje 2144 funcionários efetivos e 333 comissionados. Os cortes irão incidir nos funcionários que não fazem parte do quadro efetivo. Ainda assim, são funcionários que auxiliam em diversas funções, ajudando até nos estudos antropológicos.

Uma das áreas que deve sofrer cortes e promover complicações aos direitos indígenas é a de "Fiscalização e Demarcação de Terras Indígenas, Localização e Proteção de Índios Isolados e de Recente Contato". Elder Paulo Ribas, coordenador da Funai em Ponta Porã, umas das três regionais no estado, explicou que cerca de 103 funcionários devem ser demitidos em todo o Brasil.

“Olha, a situação já está bem ruim. Tenho 13 servidores em Ponta Porã e mais 7 em outros lugares, que são as Coordenadorias Técnicas Locais [CTLs]. Dourados está numa situação parecida, uns 20 servidores. O nosso maior problema é que como somos unidades gestoras, temos que fazer contratos, precisa de muita gente. A parte territorial e ambiental também demanda muita gente”, contou o coordenador.

Demarcações de terra

Um dos principais problemas da redução estrutural da Funai, na opinião de pessoas que lidam com direitos indígenas, é que o órgão já fragilizado, pode sofrer com a redução nos processos de demarcação de terras. A assessoria da Funai afirmou que a Coordenação Geral de Identificação e Delimitação de Terras Indígenas possui 12 servidores ativos permanentes, 3 servidores sem vínculo, e 1 em contrato temporário. Elder contou que existem somente 7 antropólogos que atendem a demanda de todo o país.

“É importante ter antropólogo aqui na sede, mas a demarcação e os procedimentos administrativos são feitos principalmente na Cgid (Coordenação-Geral de Identificação e Delimitação), que fica na sede de Brasília, que também tem 7 antropólogos para atender a demanda do Brasil inteiro. São cerca de 100 áreas em estudo  e outras reivindicações”, contou.

Além disso, a Funai ainda enfrenta um processo de “criminalização ideológica”, sendo investigada na Câmara dos deputados em CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito), justamente no que se refere à validade dos relatórios de demarcação.

“Eu tenho um antropólogo nomeado e em Dourados tem outro nomeado, o nosso temor é que se eles insistirem em extinguir os assistentes seria justamente não ter mais antropólogos. A nossa demanda precisa muito de antropólogos, de assistente social, que a sorte é que entrou uma [assistente social] no concurso. A possibilidade é que o nosso quadro caia drasticamente nos próximos anos. Estamos com um orçamento igual ao de 2006, o corte foi grande”, explicou o coordenador.

Com a redução de funcionários é possível que algumas CTLs desapareçam. O coordenador de Ponta Porã explicou que há cidades no interior de Mato Grosso do Sul que possuem somente um funcionário comissionado representando a Funai. Na região sul, que possui histórico de problemas com a situação dos Guaranis e Kaiowás, que sofrem violências diversas no processos de retomada, a situação é precária. Eder contou que Amambai possui 5 funcionários,  Iguatemi 2, Tacuru 1 e Paranhos 1.

Antônio João não tem nenhum funcionário. A região foi palco do assassinato de Simião Vilhalva. As investigações indicam articulação de fazendeiros da propriedade que incide na terra Guarani e Kaiowá já homologada, Ñande Ru Marangatu. A morte teria ocorrido após reunião do Sindicato Rural sobre a retomada indígena feita na terra. Na reunião estavam presentes, além da proprietária da fazenda e presidente do sindicato, Roseli Maria Ruiz, os deputados federais Luiz Henrique Mandetta (DEM/MS), Tereza Cristina (PSB/MS) e do senador Waldemir Moka (PMDB/MS).

Falta de concursos e funcionários antigos

Os funcionários comissionados ou temporários suprem a falta de funcionários concursados, já que a Funai realizou apenas dois concursos desde que foi fundada. Do quadro efetivo, além disso, cerca de 55% dos funcionários estão para se aposentarem ou em processo de aposentadoria, conforme explicou Elder, o que deve diminuir ainda mais o quadro.

“Precisamos de concurso e contratações novas, o corte já vai ser um baque grande. A gente está numa situação bem precária. Estamos fazendo o possível, isso gera diversos problemas, atrasos nas licitações, andamento nos processos, quebra um carro não tem mecânico etc”, declarou o coordenador.

“Há previsão de concurso para este ano, em fase de contratação da banca. A prioridade do concurso é preencher vagas na Amazônia Legal”, foi o que informou a assessoria do órgão em Brasília.

Elder contou que a Funai pediu um prazo de 4 meses para poder se reorganizar e se preparar para os cortes. A previsão, de acordo com ele, é que coordenações sejam fundidas e de que haja uma alteração no modelo, para que a mudança não seja tão drástica para os povos indígenas.